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Possue ainda grandes mattas virgens, povoadas de passarinhos, onde o machado, o fogo e a imprevidência imperdoável dos homens, tem destruído este grande thesouro do nosso paiz".(Antonio de Assis Martins: no Almanak Administrativo Civil e Industrial da Província de Minas – Geraes, do anno 1.869 para servir no anno de 1.870)
Com o trecho acima, há 120 anos, o cronista do império demonstrava sua preocupação pelo destino da natureza mineira. Há poucos anos o Rio Chopotó abrigava lontras, capivaras e pacas – isso sem falar nos bagres, traíras, acarás, cascudos, piaus e lambaris que, praticamente, foram exterminados sob nossas vistas. Destino igual teve o "canário da terra", que poderia ser o símbolo da cidade, tal a sua abundância.
A visão atual do ecossistema mundial é grave. Envolve risco na utilização da energia atômica, poluição sonora e do ar, queimadas, chuvas ácidas, alteração da camada de ozônio, alternância de secas e enchentes, agressão aos mares, destruição de florestas e rios, proliferação de insetos e propagação de doenças infetco-parasitárias, abuso na utilização de agrotóxicos, etc.
Alguns ecologistas consideram que, habitando as pequenas cidades, pássaros e pequenos animais poderão ter, eventualmente, maior proteção ambiental. Nos últimos meses algumas dezenas de canarinhos da terra foram criados em cativeiro. É claro que, se em liberdade este número seria muito maior.
Nossa cidade já foi riquíssima em arquitetura e recursos naturais.
Os canarinhos soltos hoje, se protegidos pela sociedade firmarão nosso interesse em resgatar o mínimo possível do nosso passado.
Jogue canjiquinha de arroz e de milho no seu quintal. Sempre no mesmo lugar.
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O texto acima foi escrito por Marcus Cremonese (possivelmente em meados da década de 70) a pedido do Dr. Ronaldo Ribeiro. Impresso num papel AMARELO foi distribuído ao POVO GUIDOVALENSE.# # # # # # # # # # # # #
" Eu morava em Santa Teresa e o Ronaldo Ribeiro no Cosme Velho. Um dia ele apareceu lá em casa e me disse mais ou menos assim:
" Marquinho, em meio às muitas outras coisas da nossa terra que já se perderam, uma delas ainda pode ser salva: é o canário da terra". O canário é uma das paixões do Ronaldo (as outras duas são o Tom Jobim e o jazz). Ele instituiu o canário como símbolo da fauna do Sapé. Marcou para um certo dia (não me lembro, faz muito tempo) e promoveu uma espécie de "ato cívico", na praça, quando foram soltos um grande número de canários, criados em gaiolas, para que eles pudessem voltar às matas, procriar, e continuar colorindo o cenário, e encantando os ouvidos de todos com o seu canto. Isso foi há mais de quinze anos. Mas era preciso conscientizar a população sobre o que estava sendo planejado; do contrário seriam apenas mais canários soltos para caírem de novo nos alçapões e voltarem para as gaiolas. Muitos dos canários, acostumados a comer em cativeiro, sentiriam dificuldades no início, para encontrar suas próprias fontes de alimento. Daí seria necessário, de novo, mais conscientização no sentido de a comunidade facilitar a alimentação dos pássaros. Para explicar o seu plano e levar adiante o ato cívico, o Ronaldo me pediu que eu redigisse umas "mal-traçadas" linhas, que seriam impressas num panfleto. E saiu esse texto. Mesmo à distância, dei a minha pequena colaboração no sentido de, pelo menos tentar, salvar o canarinho da extinção. Mas, de fato, toda a idéia e a maioria das palavras que eu escrevi (ou transcrevi) ali são do Ronaldo Ribeiro."